EMMANUEL FERRY
Ser imortal é insignificante; com excessão do homem,
todas as criaturas o são, pois ignoram a morte.
J. L. Borges
De repente a vida nos põe a viver duas experiências próximas uma da outra, duas experiências aparentemente distintas, lado A e lado B, e adianta perguntar Por que, vida, Será que por que uma não permite senão compreender melhor o significado da outra. Lado A, De repente como que do nada a Mãe me chama até ao quarto e me faz ver Emmanuel chorando, mais que chorando simplesmente, convulsivamente chorando e abandonado aos solavancos daquele grande corpo branco tomado de emoção. Por que chora, Emmanuel, perguntava e ele não podia responder, insistia e ele me abraçava e ainda mais chorava do que antes, Por que, Emmanuel, e nada. Até que a Mãe explicou que ele estava lembrando. Enquanto a tarde morna caía lentamente sobre os edifícios niteroienses, Emmanuel com seus ruídos em sépia e cheiros de motor de serraria funcionando e notas antigas citadas no vento, Emmanuel, que então chorava, caía fundo no poço sem fundo do tempo rumo ao passado, até aquele ponto preciso de uns dez anos de vida na varanda da casa chutando bola com o Irmão, sem saber que arremessava uma espécie de bumerangue para o futuro, ou melhor, para si mesmo condenando-se a voltar sempre às próprias mãos atiradeiras. Eu retruquei que algum dia ele estaria chorando por esse momento em que estamos abraçados e ele só disse Que se lembrava sempre da mesma coisa e do mesmo momento. E eu que chorara quase uns dois dias antes, Lado B, lendo o filósofo Ferry que numa entrevista dizia Que não é apenas o fim da vida, mas a experiência do tempo e de sua finitude dentro da vida, no sentido de momentos irreversíveis que voltam à experiência vivida apenas para lembrar que nunca mais voltarão em si mesmos, como vivências mais uma vez, que isto sim, este escapar sem remissão nem retorno, significava morrer e então Emmanuel chorava porque estava tendo, naquele cair de tarde niterioiense, a líquida e exata e essencial e invencível experiência pessoal da morte.
todas as criaturas o são, pois ignoram a morte.
J. L. Borges
De repente a vida nos põe a viver duas experiências próximas uma da outra, duas experiências aparentemente distintas, lado A e lado B, e adianta perguntar Por que, vida, Será que por que uma não permite senão compreender melhor o significado da outra. Lado A, De repente como que do nada a Mãe me chama até ao quarto e me faz ver Emmanuel chorando, mais que chorando simplesmente, convulsivamente chorando e abandonado aos solavancos daquele grande corpo branco tomado de emoção. Por que chora, Emmanuel, perguntava e ele não podia responder, insistia e ele me abraçava e ainda mais chorava do que antes, Por que, Emmanuel, e nada. Até que a Mãe explicou que ele estava lembrando. Enquanto a tarde morna caía lentamente sobre os edifícios niteroienses, Emmanuel com seus ruídos em sépia e cheiros de motor de serraria funcionando e notas antigas citadas no vento, Emmanuel, que então chorava, caía fundo no poço sem fundo do tempo rumo ao passado, até aquele ponto preciso de uns dez anos de vida na varanda da casa chutando bola com o Irmão, sem saber que arremessava uma espécie de bumerangue para o futuro, ou melhor, para si mesmo condenando-se a voltar sempre às próprias mãos atiradeiras. Eu retruquei que algum dia ele estaria chorando por esse momento em que estamos abraçados e ele só disse Que se lembrava sempre da mesma coisa e do mesmo momento. E eu que chorara quase uns dois dias antes, Lado B, lendo o filósofo Ferry que numa entrevista dizia Que não é apenas o fim da vida, mas a experiência do tempo e de sua finitude dentro da vida, no sentido de momentos irreversíveis que voltam à experiência vivida apenas para lembrar que nunca mais voltarão em si mesmos, como vivências mais uma vez, que isto sim, este escapar sem remissão nem retorno, significava morrer e então Emmanuel chorava porque estava tendo, naquele cair de tarde niterioiense, a líquida e exata e essencial e invencível experiência pessoal da morte.
2 Comments:
A morte do menino de dez anos no interior do grande corpo branco.
... e essa morte dói, dói, dói.
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